sábado, maio 28, 2005

cegonha

Esta estória está perfeitamente datada.
Ocorreu no dia 20 de Setembro de 1962 e quase poderia dizer a que horas aconteceu. A minha mãe sabe-o certamente.
Eu tinha então 5 anos, feitos em Fevereiro, e a minha irmã 3 anos, feitos em Junho.
Moravamos num andar, não recordo qual, num prédio das 'Caixas', de fronte ao terreiro onde faziam a feira do gado. Para lá deste terreiro, tenho ideia que se viam apenas algumas, poucas, pequenas casas isoladas e dispersas pelos montes.
Das janelas viamos o citado terreiro da feira, e lá ao fundo as faldas da Serra do Marão que, quando nevava no Inverno, maravilhavam os meus olhinhos, curiosos e deliciados na fruição daquele lençol branco, que eu sabia gelado, que se estendia por ali acima, até aos píncaros.

A minha mãe estava grávida, do seu terceiro e último filho.
Tivera em mente fazer com ele o 'truque' que fizera com a minha irmã, porque não lhe agradava a ideia de ter descendência transmontana, pois a família era toda alfacinha. O 'truque' fora algo simples: quando estava quase a terminar o tempo de gravidez, a minha mãe deslocou-se para Lisboa para casa de familiares, de uma tia que morava em Benfica, para ter a filha na Capital. O 'timing', como hoje se diz, foi perfeito, e a minha irmã nasceu em Benfica, Lisboa, alfacinha de gema, no dia 9 de Junho de 1959. Passados alguns dias 'migrou' para Vila Real, onde continuámos a viver.
Mas o destino, ou talvez algum factor que eu desconheço, desta feita resolveu pregar uma partida. E o Julinho teve mesmo que vir ao mundo em terras transmontanas. Coisa que não o incomoda nada, nem a ninguém aliás, e até o diverte.

Ora naquela época não se considerava correcto, como hoje se faz, explicar a crianças muito pequenas que os bebés cresciam dentro da barriga das mães, e que para nascer saíam pelo 'pipi'.
Não, naquele tempo estava muito em voga a famosíssima tese da 'cegonha francesa'. Esta consiste basicamente em dizer às inocentes crianças, que as pessoas achavam serem estúpidas, que o bebé vinha de França pendurado no bico de uma prestimosa cegonha, que entrava pela janela e o entregava na casa onde ia nascer, depositando-o com cuidado e carinho ao lado da mãe...

Naquele dia percebemos que se estava a passar alguma coisa fora do normal.
A mãe estava metida no quarto e não nos deixaram lá entrar. Havia gente desconhecida em casa e tudo num grande corrupio. Hoje sei que se tratava da parteira.
Lembro-me de eu e a minha irmã andarmos à volta da avó e do pai, a insistir com perguntas: "Quando é que nasce o bebé", "Como é que nasce o bebé", "De onde vem o bebé", etc.
E lá nos impingiram a 'tese da cegonha francesa'...

Lembro-me que queriamos ver a cegonha vir pelo ar a voar com o nosso irmãozinho no bico e vê-la entrar pela janela.
Lembro-me que alguém, acho que o pai, nos colocou junto da janela, a tal que dava para a frente do prédio, para a feira, com a indicação de que dali veríamos a almejada cegonha.
Lembro-me de estar nessa janela com a minha irmã ao meu lado, os dois a olhar os montes e o céu, sobretudo o céu, à espera da dita cegonha.
Lembro-me de alguém ter exclamado "Já nasceu!"
Lembro-me que eu e a minha irmã ficámos contentíssimos por termos um irmãozinho, mas também tristíssimos por não termos visto a cegonha.


Lembro-me de no decorrer do dia ter pensado: a janela do quarto dos meus pais era na traseira do prédio, do lado oposto àquele onde nos encontrávamos, onde nos puseram...

2 comentários:

Anónimo disse...

para quem esperava ver uma cegonha e acabou por ver um transmontano de gema ja ´não é mau. e a hora eram 10horas e 20 minutos. beijos e saudações transmontanas. xuxayte

Unknown disse...

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Entonces oh travanca?

"Transmontano de gema"... d'ovo! Eheh

Fica registada a hora. É por isso que gostas de estar na cama até ao meio-dia... :)))

bjs do mano velho, alfacinha de gema

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